quarta-feira, 28 de março de 2012

Todos compulsivos?

Vivemos em uma época onde tudo parece ser possível, ou pior, tudo virou uma questão de necessidade! Deparamos o tempo todo, nos espaços públicos, nos encontros, nas salas de aula, com o que a grande oferta atual de produtos e tecnologias tem causado aos modos de relacionamento humano. Se antes era difícil se relacionar, agora isso não entra nem mais na pauta do dia. Entre eu e o outro, agora existem o smartphone, o facebook, os i-tudo (i-pad, i-mac, i-pod, i-toch, i-phone). Relacionamo-nos agora é com esse tipo de coisa. A presença do outro vem a reboque como uma mera consequência. Não tem como a Psicanálise não se implicar e não se posicionar frente ao sem-limites do nosso mundo, ao gozo desenfreado da sociedade atual.
A cada semana prometem a felicidade. Nós, pobres humanos, acreditamos nesta ilusão, entramos no circuito da compra infinita, na corrida pela atualização. Queremos ter o melhor, o mais rápido, porém, a cada dia o melhor já não é o melhor. O cobiçado de hoje é o vergonhoso de amanhã. Que modo de vida é esse onde o melhor é efêmero? Desaparece na mesma velocidade que chega. Será então que realmente isso é o melhor? Puro jogo do mercado. Exercemos o poder de compra, mas nesse jogo de poder, acabamos entrando como subordinados. Os subordinados ao sem-limites do mundo tecnológico. Quais os efeitos desse modo de vida? Mega-solidões, Giga-isolamentos. O tratamento para este mal é o “Compre mais!”. Não perca tempo! Agora sim com este próximo produto você será feliz! Acesse o mundo e se conecte com todos! Porém, não nos avisaram do risco de se desconectar de si mesmo.
Pessoas vazias e sem direção. A i-fantasia desses produtos descartáveis se sustenta à custa de um mal-estar global. A sensação de desamparo é nítida, principalmente na classe jovem, parcela da população que acabou sendo mais fisgada por essa promessa fantasiosa de felicidade. Reparamos que os adolescentes só se movem em função dos objetos da tecnologia. Só se movem e se movem sós! A falta de ideais têm-lhes causado uma nova doença psíquica que eu chamo de i-tédio.
A compulsão é generalizada. Somos todos toxicômanos, dependentes e drogados pelos objetos. Existem vários tipos de drogas por aí, muito além das químicas. Objetos que nos alienam e nos tornam cada dia mais obcecados e cegos pela satisfação, não importa o quanto isso vai nos custar. E o preço que pagamos não é somente em dinheiro. Como andam os estudos, os namoros, as disputas que antes eram éticas e leais, os laços sociais? O que negligenciamos de um lado, volta com mais força por outro. Agressividade e ansiedade são alguns dos efeitos que as pessoas da geração i-posso tudo sentem quando são confrontadas com o ‘não’.
Estamos todos iguais, sem diferença, pois todos são consumidores. Todos são nivelados pela compulsão. A marca particular de cada um desapareceu. O traço singular que me possibilita viver de acordo com meu desejo está perdendo espaço. A diferença entre os seres é recusada. Mas o que fazer se é exatamente essa diferença que promove a graça da vida? Aquele que não é igual, que não compartilha da mesma compulsão está fora da rede. Uma rede virtual, nada real.

2 comentários:

  1. Ótima reflexão, Thales. Sempre que penso nessa questão de um exagero contemporâneo em encontrar um objeto que satisfaça (e parece que a proposta capitalista é de que o próximo objeto será esse) lembro do Freud lá dos Três Ensaios falando que há entre pulsão e objeto apenas uma "solda". Dá o que pensar, porque ao buscar um objeto que traga felicidade estamos agindo em franca contradição a essa idéia, acreditando que podemos ligar a pulsão a algo por mais do que essa solda.

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  2. A "solda", ou esse espaço insaciável que existe entre a pulsão e o objeto deve ser o motor da vida. Acho que aqui Lacan encontrou em Freud as bases do conceito de objeto causa de desejo, o tal 'objeto a'. O vazio inesgotável que causa a busca humana.
    Eu sempre te digo isso, Lacan é freudiano. Ele mesmo se dizia assim.
    Grande abraço e valeu pela presença aqui no blog mais uma vez.

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