segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

A perda do líder: possibilidade de sonho


A morte do ditador norte-coreano Kim Jong-il nos conduz a pensar muitas coisas pelas quais a humanidade passa, porém ainda ignora como se fosse algo trivial. Trata-se da relação das massas com seu líder, da alienação mental em torno da figura de grandes líderes ou em torno de ditadores. Já cansamos de ver as consequências devastadoras de movimentos que abolem a vida privada em nome dos ideais do grupo. O ser humano é capaz de tudo quando age em nome do bando. Desde pequenos grupos, turmas, até grandes nações, percebemos movimentos em torno de um ideal de onipotência. Os fanatismos religiosos estão no mesmo patamar dos líderes radicais como Hitler, Sadan Hussein, Kadafi e agora Kim Jong-il.

Ao ver as reportagens e vídeos mostrando a reação da população norte coreana com a morte do ditador, fiquei atento ao choro marcante do povo, diante da perda de sua referência. Na população feminina isso ainda é mais notável, quando aparecem aos prantos nas ruas. A perda da referência identificatória, daquele que garantia a ilusão comum da nação norte-coreana ainda vai ressoar bastante no povo. No lugar do ser imortal e imponente, agora só restam o vazio e a desestruturação da identificação imaginária. Uma crise que pode abrir espaço para sonhos e buscas particulares. Aliás, não somente na Coreia do Norte, mas em qualquer lugar do mundo, o vazio e o furo no imaginário sedutor abre espaço para o sujeito sonhar, buscar, realizar. Porém, por lá, rapidamente já elegeram o sucessor (o adolescente filho do ditador) a fim de não verem abaladas as estruturas da comunidade, da comum unidade. A política do falecido Kim Jong-il, que promove a amputação do desejo singular e o esmagamento do que pode haver de particular é capaz de fazer uma nação inteira viver alienada. 
Não podemos deixar de percorrer o texto de Freud "Psicologia das massas e análise do eu" e da discussão que ele desenvolve lá ao explicar o mecanismo que existe na estrutura dos movimentos populares e de condução de grupos por uma identificação alienada ao ser portador da liderança. Exteriorizamos na figura externa nossa responsabilidade sobre nós mesmos e depositamos no líder toda esperança de salvação, de cura, de conforto. O preço por isso é altíssimo. Pagamos com nossos sonhos mais íntimos, nossas fantasias mais preciosas em nome da unidade inabalável do grupo. Abrimos mão de projetos particulares para satisfazer o projeto da proposta única do grupo.
Não precisa ir muito longe para encontrarmos discursos alienantes nos quais as pessoas se agarrem para automaticamente se desresponsabilizarem de seus desejos, seus feitos e até mesmo seus erros. O ser humano faz de tudo para abrir mão de seu desejo e eleger o outro como grande culpado do fracasso. Daí então um meio de entender por que tantas pessoas se submetem a regimes totalitários ou práticas alienantes, ou seja, para nada saberem de si mesmas. É a fuga covarde, a escolha pela ignorância, para do desejo nada querer saber. Por isso, ainda veremos muitos ditadores pelo mundo. Há quem precise deles, infelizmente!

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Na era digital, nada melhor do que um próprio ícone da área para nos alertar:

"Meus filhos terão computadores, sim, mas antes terão livros. Sem livros, sem leitura, os nossos filhos serão incapazes de escrever - inclusive a sua própria história."
Bill Gates

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Desafio

Quem são as celebridades pensantes abaixo, estilizadas à maneira 'The Simpsons'?
O último à direita já lhes digo que é Michel Foucault. Mas e os demais?
Quem acertar ganha um doce de leite do pé da vaca.

Articulação: Psicanálise e a arte do Arqueiro Zen

O que pode haver de similar entre o ato analítico e a postura zen no tiro com o arco?
A meu ver, tais práticas são fortemente marcadas por um fator, o Mushin. 
Tal postura nos remete ao estado de 'não mente' ao 'nada na mente' e desprendimento de si mesmo, para que a intenção ceda espaço à tensão, única responsável por tocar aquilo que realmente precisa ser tocado, logo, o real da pulsão.
Para melhor entender o que pretendo introduzir aqui, sugiro o livro do filósofo alemão Eugen Herrigel "A arte cavalheiresca do arqueiro zen". Trata-se do relato de sua experiência com a transmissão zen na arte de tiro com arco, sob a tutela do mestre japonês Sensei Awa Kenzo.
Abaixo um antigo vídeo do sensei Awa.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

É possível ser feliz?

          Apesar de ser um assunto antigo que percorre a humanidade antes mesmo das filosofias gregas, o tema da felicidade parece ser muito atual.
A Psicanálise sempre problematizou a “felicidade”, e atualmente com mais vigor tem debatido este assunto nos congressos, seminários e nas instituições diversas. Talvez o interesse por esse assunto tenha aumentado porque nunca tivemos uma época tão adoecida e depressiva como a nossa contemporânea.
Pois bem, é possível ser feliz?
            Freud, em 1930, no seu belíssimo texto “O mal estar na civilização” afirma que a felicidade não nasce junta conosco, não está inclusa no material genético e é um momento raro, que ocorre com muito menos frequência do que os momentos de mal estar e desprazer. A tal felicidade suprema almejada é um horizonte inatingível e o máximo que podemos sentir são pequenos momentos de prazer.
Nos dias de hoje, cada vez mais temos percebido o aumento do número de pessoas insatisfeitas e desanimadas com a vida. Basta vermos o número abusivo do consumo de antidepressivos e ansiolíticos, muitos adquiridos até sem receita médica; além é claro, do aumento do uso de drogas e abusos do álcool. Nunca se consumiu tanta droga, álcool, e tanto psicofármaco na história da humanidade. Por que será? Alguns leitores dirão que é devido ao fato de termos maior acesso ao consumo. Porém, há outra coisa por trás disso, com maior peso do que as estratégias da indústria farmacêutica ou do tráfico de drogas, ou seja, o ser humano iludido.
A configuração de vida na era contemporânea nos coloca a querer respostas rápidas e sensações intensas sempre, sem o menor esforço. Isto é, queremos ser felizes, mas de forma a não gastarmos nenhum empenho energético, emocional e físico inclusive. As crianças estão assim, os adolescentes nem se fala, e os adultos parecem já terem jogado a toalha, caindo em um tédio sem fim. Queremos engolir um remédio mágico e acordarmos plenos, satisfeitos.
Se isso é ser feliz hoje em dia, então podemos dizer que todos somos felizes! Que maravilha!
Ilusão. Vazio entediante, que mais cedo ou mais tarde nos jogará de frente à dura realidade. Realidade onde temos que construir as coisas, os sonhos, os objetivos na vida, e isso inclui também o estado de prazer e felicidade que almejamos, mas que os alerto, não será pleno de forma alguma.
Não queremos investir na busca, na aventura de viver sem saber ao certo o que encontraremos pela frente. Esquecemo-nos de encarar a vida com todos os mistérios e incertezas que ela carrega, pois é isso mesmo que pode nos trazer graça. A era digital nos fez crer que tudo é possível, inclusive ignorar a imprevisibilidade da vida. Como somos estúpidos, pois o imprevisível é o que nos faz sermos felizes, mesmo que momentaneamente. São desses pequenos e raros momentos, não sabidos, não planejados, não medidos, que podemos extrair prazer. Somente assim eu acho que poderemos afirmar: é possível ser feliz, não toda vez, mas de vez em quando, em cada vez.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Em época de pressa, pressão e compulsão é bom lembrar que:

"Was man nicht erfliegen kann, muss man erhinken.
Die Schrift sagt, es ist keine Sünde zu hinken"
                       
"Ao que não podemos chegar voando, temos de chegar mancando.
A escritura diz que não há pecado em claudicar"

Este trecho - retirado da versão de Rückert dos Maqâmât de al-Hariri (literatura árabe) encontrado no 'Die Beiden Gulden' -, foi citado por Freud em 1920 no final de "Além do Princípio do Prazer".

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Em época de protestos é bom lembrar que...

"As revoluções começam sempre nas ruas sem saída"
"Desgraçado é o país que precisa de heróis"


Bertolt Brecht (Poeta e dramaturgo alemão)

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Michel Foucault - Sobre o paradoxo do louco

Percurso sobre o louco, da era Clássica à Modernidade.
Será também essa, a nossa forma de o entender, até hoje, na pós modernidade?

"O Louco doravante está livre, e excluído da liberdade. Outrora ele era livre durante o momento em que começava a perder sua liberdade; é livre agora no amplo espaço em que já a perdeu."
História da Loucura - Capítulo 14 'O círculo Antropológico'.
Ao louco é dado liberdade, porém somente dentro dos muros fechados dos hospitais. Raramente os encontramos pela cidade afora.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Transtorno mental: problema cerebral ou psíquico?

Assusta-me a grande quantidade de pessoas, inclusive crianças, fazendo uso de antidepressivos e ansiolíticos. Os transtornos mentais, sejam eles leves ou graves, são problemas no funcionamento dos neurônios? Ou são causados por desarranjos psíquicos? Quando digo ‘psíquico’ quero falar de causas afetivas, emocionais, que surgem de nossas experiências no mundo, na infância, na família, nos relacionamentos, com os pais... Enfim, fruto da vivência humana.
Existe uma forte corrente científica que acredita unicamente no “desequilíbrio químico” do cérebro. Porém esta ideia nunca conseguiu ao certo provar-se como verdade única, mesmo que os laboratórios insistam nessa tese e queiram alienar a população, fazendo-a acreditar cada dia mais somente nisso. Afinal, vender remédio é imensamente lucrativo. Quanto mais pessoas confiando que o cérebro é a causa da depressão, mais remédios serão vendidos.
Mas por que, mesmo sabendo que a causa de seus problemas são outros, as pessoas insistem nos remédios e acreditam cegamente nas teses neuronais? É uma ferida na onipotência e no narcisismo, além de vergonhoso para alguns, assumir que existem problemas em casa, na vida íntima. Assim, fica mais fácil eu dizer que a causa de minha agressividade é porque Deus fez meu cérebro com falta de serotonina, ou com excesso de dopamina. Portanto, no meio social, passo uma impressão de que o problema não é meu, mas do meu cérebro. É como se a causa de meu transtorno mental não passasse pelas minhas escolhas e desacertos da vida, dos quais eu sou responsável. Esse raciocínio de passividade e vitimização de nossa época nos fez ganhar o rótulo de Geração T. Isto é, Geração Testemunha, que acompanha tudo que acontece, mas é incapaz de analisar e criticar o que se passa consigo mesma.
O problema que causa uma febre não é a falta de aspirina no corpo, e sentir dor não é devido à falta de morfina no corpo, como se fôssemos doentes por não termos todas as substâncias dentro de nós. O que faz uma criança ser agitada e desatenta não é um desequilíbrio químico dos neurônios. Antes mesmo de o remédio entrar em sua vida, preste a atenção nas coisas que já aconteciam e que não vinham muito bem. São raríssimos os casos em que a causa de um transtorno mental é biológica, mas raríssimos mesmo!
O remédio muda sua vida ou apenas ameniza seus sintomas? É melhor sempre cuidar do machucado ou entender por que se machuca tanto? Acreditamos demais nos tais milagres da química divulgados na mídia. Quando colocaremos o pé no chão real da vida e assumiremos responsabilidades pelos transtornos? Deixaremos que a ciência nos conduza como única luz possível neste túnel escuro?
Faço-lhes uma indicação de leitura que me pôs a pensar mais neste tema. Trata-se da reportagem “A Epidemia de Doença Mental” de Márcia Angell na Revista Piauí de agosto deste ano, nº59. Vale a pena não ficar tão alienado e parar de se enganar às custas da indústria farmacêutica. O destino de sua vida passa pelas suas escolhas, muito mais do que pelas sinapses de seus neurônios. 

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Paul Valéry

Ambroise-Paul-Toussaint-Jules Valéry, foi um filósofo, escritor e poeta francês.
"Les livres ont les mêmes ennemis que les gens: le feu, l'humidité, les animaux, la météo, et leur propre contenu"
"Os livros têm os mesmos inimigos que as pessoasfogo, umidade, animais, clima, e seu próprio conteúdo "

Um pedacinho da história da loucura... Brant, Bosch, Erasmo de Rotterdan, Foucault e o inusitado Billie Joe Armstrong

Segue aqui o artista Hieronimus Bosch e suas ilustrações sobre o modo como se interpretavam e tratavam as manifestações psíquicas na era clássica, fim do tempo medieval. Marco do início da 'Grande Internação', da forma como Michel Foucault nos explica, e início da exclusão do 'louco' dos meios culturais, como se a ele não fosse possível o direito à vida social. Essa é uma longa discussão... que nos atravessa ainda hoje.

Segue aqui o Navio dos Loucos ou a Nau dos Loucos - Narrenschiff. Uma ilustração sobre o período em que as cidades expulsavam seus 'loucos' e os destinavam aos asilos espalhados por toda Europa, através de grandes embarcações rios acima e abaixo. Alguns dizem que Bosch ilustrou o que Sebastian Brant escreveu em sua obra Das Narrenschiff de 1492 ou Stultifera Navis versão em latim de 1497.


Tentativa do homem dito" racional" de expurgar a insanidade de dentro das cidades, porém, ironicamente o louco leva consigo um saber trágico e revelador, apreciado e inatingível pelos homens "normais". A árvore que a Nau traz como mastro principal representa o saber (árvore proibida, a árvore da imortalidade pretendida). O  embarque anunciava a Grande Internação que estava por vir, tendo seu marco com a criação em 1656 do Hospital Geral de Paris, uma instituição pautada nos moldes morais, muito mais do que sob princípios médicos.


E abaixo a Extração da Pedra da Loucura ou Cura da Loucura - Das Steinschneiden. Diante do não saber o que fazer com a 'loucura', tentava-se retirar do cérebro alguma causa ou núcleo causador do mal estar psíquico. Ou quem sabe os invejosos tentavam tirar do louco seu saber em lidar com a vida de modo natural e livre? 




Diferente do que Brant e Bosch retratavam, tudo que havia de obscuro da loucura que espreitava o homem de fora para dentro, com Erasmo de Rotterdam em 1509 ao promover o Elogio da Loucura a insanidade passa ser o que se insunua de dentro do próprio homem em seu conflito consigo mesmo. Neste sentido, Foucault na História da Loucura na Idade Clássica compila: "A loucura só existe em cada homem, porque é o homem que a constitui no apego que ele demonstra por si mesmo e através das ilusões com que se alimenta"
Portanto, não nos esqueçamos do alerta de um cantor de nossa época, Billie Joe Armstrong do Green Day:
The space that's in between insane and insecure.

Oh therapy, can you please fill the void?
Am I retarded?
Or am I just overjoyed?
Nobody's perfect and I stand accused,
For lack of a better word and that's my best excuse.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

A Sublimação além do crime

O sujeito se mostra vivo na criação, até mesmo dentro da instituição!
Segue a poesia lavrada pelo delegado Reinaldo Lobo a respeito de um crime, na 29ª DP, de Riacho Fundo(18 quilômetros de Brasília). 
Vale a pena conferir a reportagem: 
http://g1.globo.com/distrito-federal/noticia/2011/08/delegado-do-distrito-federal-relata-crime-em-forma-de-poesia.html
"Já era quase madrugada
Neste querido Riacho Fundo
Cidade muito amada
Que arranca elogios de todo mundo
O plantão estava tranqüilo
Até que de longe se escuta um zunido
E todos passam a esperar
A chegada da Polícia Militar
Logo surge a viatura
Desce um policial fardado
Que sem nenhuma frescura
Traz preso um sujeito folgado
Procura pela Autoridade
Narra a ele a sua verdade
Que o prendeu sem piedade
Pois sem nenhuma autorização
Pelas ruas ermas todo tranquilão
Estava em uma motocicleta com restrição
A Autoridade desconfiada
Já iniciou o seu sermão
Mostrou ao preso a papelada
Que a sua ficha era do cão
Ia checar sua situação
O preso pediu desculpa
Disse que não tinha culpa
Pois só estava na garupa
Foi checada a situação
Ele é mesmo sem noção
Estava preso na domiciliar
Não conseguiu mais se explicar
A motocicleta era roubada
A sua boa fé era furada
Se na garupa ou no volante
Sei que fiz esse flagrante
Desse cara petulante
Que no crime não é estreante
Foi lavrado o flagrante
Pelo crime de receptação
Pois só com a polícia atuante
Protegeremos a população
A fiança foi fixada
E claro não foi paga
E enquanto não vier a cutucada
Manteremos assim preso qualquer pessoa má afamada
Já hoje aqui esteve pra testemunhá
A vítima, meu quase chará
Cuja felicidade do seu gargalho
Nos fez compensar todo o trabalho
As diligências foram concluídas
O inquérito me vem pra relatar
Mas como nesta satélite acabamos de chegar
E não trouxemos os modelos pra usar
Resta-nos apenas inovar
Resolvi fazê-lo em poesia
Pois carrego no peito a magia
De quem ama a fantasia
De lutar pela Paz ou contra qualquer covardia
Assim seguimos em mais um plantão
Esperando a próxima situação
De terno, distintivo, pistola e caneta na mão
No cumprimento da fé de nossa missão
Riacho Fundo, 26 de Julho de 2011
Del REINALDO LOBO

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Amy Winehouse: expressão da angústia de nossa época

Natural de Londres, cantora e compositora de inigualável capacidade, voz inconfundível e estilo original, Amy Jade Winehouse falece em sua mais autêntica forma de expressão. Não escondia seu problema, não fingia para e por ninguém, não negava que sofria.
Existem várias pessoas como Amy Winehouse por aí, mas ela era a expressão máxima do ser desesperado e iludido com o falso mundo propagado de nossa época. Um ser caído na armadilha do modo de vida atual que vende uma felicidade vazia, que tenta colocar o ser humano preso aos objetos, ou presa dos objetos de consumo.
Amy tornou-se a cada dia um ícone de nosso tempo. Ela nos transmitiu o que poucos conseguem perceber: apesar de estarmos cheio de coisas, a cada dia, nos sentimos mais vazios.
Nossa condição mais real e mais verdadeira é a falta. Mas o que o mundo pós-moderno tenta fazer é nos impedir de tomarmos conhecimento de nossa própria falta. Somos chamados a consumir objetos a cada dia, um após outro e assim caímos na trama do vazio. Tentar ofuscar a falta é antecipar a morte. Sentir falta é essencial para buscarmos os projetos de vida. Mas indo contra isso existe o vazio, mantido pela aquisição desenfreada e consumismo. E isto, acredito estar na base do que de pior aconteceu com a cantora, que mostrava a cada dia o tédio no qual se encontrava.
Freud em 1914 já nos dizia desta sensação de vazio intenso, a angústia, “Angst” em alemão. Lacan como bom freudiano que foi, deu à angústia, “Angoisse” em francês, um lugar de destaque no psiquismo humano. A angústia é um sinal. Um aviso de que algo não vai bem e que um vazio está presente. Só sentimos este vazio, este aperto, quando algo ocupa o lugar da tal falta, que por princípio causaria o nosso movimento de busca e desejo. A angústia é a ausência de sentido, é a paralização do desejo, é a falta da falta.
Amy Winehouse! Aquela que mostra a todos o vazio em que o mundo se encontra. A angústia pós-moderna em carne e osso, literalmente.
Uma frase que se repete em suas músicas e que me chama a atenção é “tears dry”, que no português seria “lágrimas secam”. Denúncia de uma mulher que está sem lágrimas, que está sem como chorar por algo que nem sabe ao certo o que é. Pelas letras musicais, a cantora nos dava notícia de sua intimidade, assim como na música "Rehab" em que ela diz resistir às internações para tratamento do uso de drogas e álcool.
Amy, aos poucos, pela via artística, tentava fazer algum apoio psíquico para continuar viva. Mas o uso de drogas compulsivo, agressões e tentativas de suicídio, e ainda, sua anorexia em mais alto grau, tomaram grande parte de sua existência. Tentativas desesperadas de fazer algum furo nisso que se mostrava tão pesado e cheio para ela. Tentativas de voltar a funcionar baseada na falta? Esteve ela desejando a vida e lutando com sua pulsão de morte? 
O ser humano está se entupindo com um discurso de falsa felicidade dependente dos objetos da tecnologia e da ciência. Permitam-se faltar! Deixem-se desejar! A vida se prolonga na falta, não nesse vazio angustiante, cheio de coisas, por onde entra também o porquê das diversas compulsões

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Freud e Lacan

"A psicanálise não tenta descrever o que é a mulher — seria esta uma tarefa difícil de cumprir —,mas se empenha em indagar como é que a mulher se forma, como a mulher se desenvolve
desde criança[...] Em suma, fica-nos a impressão de que não conseguimos entender as mulheres, a menos que valorizemos essa fase de sua vinculação pré-edipiana à mãe."
Sigmund Freud -  1932 - 'Feminilidade'


"Não é necessário ser psicanalista para saber que
quando qualquer pessoa[...]nos pede algo,
isto não é para nada idêntico, 
e inclusive às vezes
é diametralmente oposto àquilo que deseja"
Jacques Lacan - 1960 - 'Psicanálise e Medicina'

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Hereditariedade e a nossa desresponsabilização

Instigado pela pergunta de Patrícia Belisário (doutora em assuntos da vida), e contando com a crítica apurada de Neuza Alves (leitora assídua), trago aqui apontamentos sobre o modo como o ser humano se aproveita do fator hereditário e do discurso da ciência para conduzir de forma negligente os problemas e adoecimentos, em especial, os de ordem psíquica.
Atualmente, a postura que algumas pessoas adotam diante de seus problemas de comportamento e conflitos de personalidade, tem sido regida pela não responsabilização ou tentativa de não implicação, como se contra uma força genética ou de hereditariedade nada fosse possível fazer. Vale lembrar que a hereditariedade para a Psicanálise leva em conta a criação que recebemos, isto é, transmissão de valores, interpretações e posturas de vida, que vão além dos códigos genéticos. Além disso, a Psicanálise caminha de modo à pessoa assumir o próprio papel diante de sua carga hereditária, tomando para si a responsabilidade por seu modo de ser, viver e se comportar, mesmo que algo escape de sua consciência e razão.
Sabemos da relação que existe entre a carga biológica com a qual nascemos e a modificação que sofremos por conta das influências do meio. Somos produto do gene ou do meio? A interação destes dois pontos é inegável, mas isso não exclui o peso de nossas escolhas e as consequências que extraímos de nossas próprias decisões.
A isenção de responsabilidade que vivemos atualmente e a supervalorização do fator hereditário, promovendo uma negligência no modo como passamos a encarar nossas falhas, erros e adoecimentos, traz um problema gravíssimo: aprendemos a colocar a culpa nos ancestrais ou naquilo que trazemos deles no DNA. Seja para um adoecimento orgânico, seja para um modo de comportamento estranho e doentio, a tendência atual é justificarmos pela via da força genética ou de criação do meio, forças encaradas como impossíveis de serem mudadas.
Para o problema da agressividade ou do alcoolismo, por exemplo, muitos se justificam nos traços de família, como se contra isso nada pudesse ser feito, a não ser aceitar calado.
Estamos pagando um preço por transportarmos para os outros (pais, professores, e até mesmo a ciência) uma responsabilidade que é de cada um. A tendência em não mudar a acomodação no desprazer e a compulsão à repetição faz com que mais e mais pessoas deixem de se apoderar dos próprios problemas, e passem a conduzir a vida de modo negligente.
Espera-se muito da ciência. Confia-se muito nos laboratórios. Porém, na vida íntima, no cotidiano particular de cada um, pouco se faz para mudar. Raramente assumimos nossas falhas, faltas, e sempre achamos alguém para culpar, no caso aqui, sobrou até para as nossas gerações passadas.
Implicar-se naquilo que você faz, mesmo que não consiga, ainda, entender por que é que você faz; assumir que isso é seu e não da hereditariedade (como se fosse algo distante ou fora de seu alcance); e se implicar naquilo que age em você é uma forma de dar direções diferentes para isso que já vem se repetindo muito antes de você nascer.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Alguns escritos e pensamentos próprios nos intervalos do consultório

A linguagem é um campo onde o ser humano entra para tornar-se sujeito. Isso não é nada natural a ele. (23/04/2012).

O isolamento e agressividade do autista é uma posição defensiva diante da presença do insuportável furo no Outro. (15/07/11).

O inconsciente gira na medida em que convidamos o sujeito a falar, apresentando-o à enunciação presente nos seus enunciados. (15/07/11)

A Psicanálise surge no momento em que as formações do inconsciente, rejeitadas pela ciência, passam a ser escutadas. (13/07/11)

A medicina trata do organismo. A psicanálise trata do corpo. O organismo não fala, não deseja; e o que conhecemos por anatomia, subjetivamente se organiza de outra forma... a neurose histérica nos dá notícia disso. (08/07/11)

Cada sujeito encontra seu modo particular de conduzir o conflito intrínseco à condição de ser humano, isto é, cada um cria uma amarração peculiar para o problema da sexualidade. É o que chamamos de sintoma na Psicanálise. (08/07/11)

É preciso que a mãe tome o filho como seu pequeno objeto de desejo, para que o filho seja capturado e não fique perdido à deriva autista. Num segundo tempo é preciso que o pai corte essa relação imaginária mãe-filho para que a criança não se prenda na psicose. (22/06/11)

O Psicótico trata a realidade e o seu corpo como coisas desamarradas e desligadas. Um pouco desta constatação é o que o neurótico não suporta, esconde e nega. (10/01/11)

A mulher insatisfeita é a causa de movimento do homem. A histérica provoca o mestre e o destitui para fazê-lo produzir mais. (22/01/11)

O analista não deve responder demandas, começando por não demandar nada do paciente, nem mesmo sua felicidade, seu sucesso. Acolhemos a demanda para fazer desta um caminho à causa de desejo. (27/01/11)

A linguagem  é um aparelho autônomo e alheio à realidade. Realidade que acaba sendo mordida e atingida por palavras.(01/02/11)

O desejo é sempre busca de algo outro, pois para sempre algo está perdido e não referenciado, a não ser, referenciado ao nada. (07/02/11)

A transferência é um efeito do discurso analítico e não da pessoa do analista. (18/03/11)

O inconsciente não é algo profundo, mas está na superfície moëbiana do corpo. (05/05/11)

A angústia é a materialização de algo no lugar onde deveria haver causa de desejo. (26/05/11)

Não me dê isso que peço, pois não é isso que quero... Amar é dar o que não se tem, é amar a falta encarnada pela pessoa amada. (13/05/11)

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Sobre o amor e o que está além disso

Passado o dia dos namorados, vamos conversar brevemente sobre o amor. O amor é uma criação humana, uma invenção demasiadamente humana. Não se engane, pois não nascemos com o dom mágico de amar.
Sem o amor não haveria a vida em civilização, não haveria amizade, namoro e nem mesmo o casamento. Além do mais, o amor nos atinge em um período estrutural de nossa personalidade, nos fazendo assim, seres sociais, diferente dos animais.
Muitos questionarão: mas os animais também se amam! O fato de formarem bandos ou viverem em conjunto não nos diz que se amam. É uma necessidade de sobrevivência, pura e simplesmente isso. O cachorrinho não ama sua cadela. É uma questão de predisposição do instinto. As grandes organizações de animais como as abelhas e formigas não se fundam a partir do amor entre si, mas do instinto de sobrevivência.
Não nascemos com capacidades de sobrevivência ou predisposições inatas que nos garantiriam sobressaírmos no mundo. Somos dependentes do outro, deste grande Outro que já nos esperava antes de nascermos (mamãe, papai, titia, vovó, vovô, irmão). Se não fôssemos acolhidos no nascimento, morreríamos, diferentemente do jacaré, por exemplo, que já faz coisas impressionantes nos primeiros minutos de vida. O ser humano é prematuro no nascimento e não possui nenhuma capacidade autônoma.
Mas o amor falha, e é fundamental que seja assim. A graça do namoro, dos relacionamentos é exatamente esta. Ou seja, nos furos e nos desencontros dos relacionamentos que a vida se torna prazerosa e permeada de desejo. Amar é assumir que precisamos do outro, é assumir que sentimos falta e somos incompletos, mas é fazer da falta uma causa de desejo, e não exigir do(a) parceiro(a) preencher e tamponar o buraco deixado pelo grande Outro do período infantil. Esta exigência cega que muitos colocam nos seus relacionamentos está próxima do amor doentio.
Por que será que nem todos conseguem amar, conseguem suportar os vazios? Poderíamos cair no dito popular de que você colhe o que planta, ou que se não foi amado não conseguirá amar. Percebo no trabalho diário que isso procede, mas tem algo que se passa além deste ponto de como a criança foi criada e não podemos nos fixar nisso. Faz uma diferença sim para a criança o modo como foi favorecido a ela um respaldo afetivo, mas a pessoa é responsável por suas escolhas e modos de vida. Mesmo os pais mais amorosos deixarão lacunas e vazios. Buracos cruciais para a criança aprender a lidar e se desenvolver. Vazios que serão projetados e reeditados nos caminhos das escolhas amorosas. O que cada um fará da falha e dos buracos deixados ao longo da constituição psíquica é problema e responsabilidade de cada um. O que cada um vai fazer de seu afeto e como vai direcionar seu modo de amar é de sua exclusiva responsabilidade.
O que fazer das lacunas deixadas? Como lidar com os vazios? Esse é o grande desafio a ser enfrentado por cada pessoa, e de quebra, por cada casal na sua aventura de amar.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

O sentido dos sonhos e seus limites de interpretabilidade

Há muito tempo os sonhos vêm intrigando as pessoas desde os tempos antigos, no mundo inteiro. Existem relatos históricos da criação de métodos de estudo e interpretação dos sonhos. Mas foi com Freud, em 1901, na Áustria, que os sonhos (nossas produções psíquicas inconscientes) ganharam um caráter diferente e inovador. Isso aconteceu por motivo da publicação do seu livro: “A Interpretação dos Sonhos”.
Freud propôs uma técnica genuína, que utiliza o sonho, como uma ferramenta para ajudar no tratamento dos conflitos psíquicos. Depois deste avanço da Psicanálise, os sonhos deixaram de ser relacionados aos significados generalizados. Ou seja, antes, os sonhos eram interpretados como coisas gerais, possuindo um mesmo valor conforme o conteúdo sonhado. Sonhou-se com um assunto, então o significado é tal. Sonhou com aquilo, então o significado é outro.
Atualmente, por um resto de herança dos métodos antigos, muitos ainda defendem a idéia de um código fixo que traduza os sonhos. Isso para a Psicanálise é um erro terrível, e a rigor, não diz nada, pois, conteúdos de sonhos, por mais que se enquadrem em temas iguais, nunca possuem um mesmo sentido em pessoas diferentes. Cada sonho tem um sentido, que só o próprio sonhador poderá construir! A interpretação deve partir do próprio sonhador, que em alguns momentos, precisa de apontamentos do psicanalista para conseguir caminhar um pouco mais no tratamento.
Mas então, o que são os sonhos? Aquela confusão de imagens e sons que não sabemos explicar?
Quando estamos dormindo, a nossa censura fica menos rígida, nossa consciência civilizada diminui, e então produzimos imagens, sons e sensações livremente.
O sonho é um dos modos que o inconsciente encontra para se expressar. Um sonho é uma manifestação do inconsciente presente em cada um de nós, e que se organiza de forma única e particular, conforme cada pessoa.
Em tratamento psicanalítico, os sonhos podem trazer as chaves que abrem os caminhos para o sucesso do paciente. Mas devo alertar, que um sonho não pode ser interpretado de forma isolada. O sonho é mais uma peça a ser colocada no quebra-cabeça que se monta aos poucos nas sessões. Peças importantíssimas que nos dão abertura para encaixar outras peças, e assim tentarmos atingir a raiz do problema.
Vale lembrar que os sonhos possuem limites de interpretabilidade, pois o psiquismo, em momentos de autodefesa, impede o sonhador de ter contato com seus conteúdos inconscientes, quando acorda. Além disso, existe o que Freud chamou de “umbigo do sonho”, isto é, um ponto intocável e inabordável, não simbolizado e obscuro. É comum uma pessoa dizer que sonhou, mas que não se lembra do conteúdo do sonho. São conteúdos ricos à condução do tratamento, mas ao mesmo tempo, causam espanto, e, por isso mesmo, a mente trata de os esquecer.
Não é por acaso que o francês Jacques Lacan (psicanalista freudiano), certa vez disse: “acordamos para continuar dormindo”.
Ora, acordamos para ficarmos longe das nossas verdades inconscientes... Longe dos nossos sonhos, e assim, continuarmos nos enganando na consciência. 

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Aos psicanalistas e interessados no conceito de Recalque (pelo menos da forma como o entendo)

Verdrängung und Angst

Freud, no texto de 1915 nos ensina que o mecanismo fundante do inconsciente é o recalque, Verdrängung. A partir da operação recalcante inicia-se a divisão do sujeito.
            Percebemos no desenvolvimento do texto que existem períodos lógicos ou etapas lógicas na constituição do inconsciente, e que isso não acontece cronologicamente. Lembro aqui da descoberta freudiana de que o inconsciente é atemporal.
Vejamos então: existe o recalque original, primevo ou precursor, que prefiro chamar de fundante. Mas este recalque fundante só se faz assim por meio dos recalques posteriores que resignificam-no. Afirma-se sua presença. Uma lógica de funcionamento semelhante ao processo de discurso humano e até mesmo à análise. Só no depois é que significamos o antes. Uma cena, palavra ou som experimentado que chamamos de S1 no decorrer da vida leva ao S2 que por sua vez retroage e estabelece um sentido sobre o outrora S1.
Os recalques posteriores são operações de defesa que incidem sobre moções pulsionais impedidas de serem satisfeitas, por trazerem desprazer ao sujeito. Estes recalques possuem ligação estreita e direta com o núcleo formado no período lógico do recalque originário. Este núcleo atrai novos recalques para assim manterem represadas as pulsões impossibilitadas de virem à tona.
Durante a leitura do texto freudiano utilizamos o termo “magnetismo” para dizer desta atração que o núcleo recalcado fundante promove nas posteriores situações da vida que por motivos subjetivos, mantenham relação com o material recalcado.
Pois bem, mas por que é preciso que o sujeito empreenda novos recalques? Por que é preciso continuar recalcando?
Vale ressaltar que nem sempre o sujeito continua a recalcar. Outros mecanismos de defesa podem ser colocados em jogo para o ser humano continuar a caminhar e a suportar a pulsão. Recusa (Verleugnung), negação (Verneinung) e a rejeição (Verwerfung) são alguns mais conhecidos por nós.
Voltemos ao questionamento anterior.
Uma quota da pulsão que por princípio satisfeita, causaria prazer, passa a ser desprazerosa por conta de quê?
Levantamos a hipótese de Freud já estar aqui neste texto de 1915, falando do que mais tarde em 1923 ele chamou de supereu, ou até mesmo do que em 1930 ele veio a chamar de “renúncias pulsionais a favor do convívio com os outros homens”.
Essa mesma pulsão outrora barrada de sua finalidade ou meta (ziel), solicita seu lugar ao sol. E quando vem, acompanha-se de seus representantes (Vorstellung). Representantes como um som, uma lembrança, uma palavra, um toque, um cheiro... Isso que retorna e pede passagem pode trazer medo, chamado no alemão freudiano de Angst.
Se há medo é sinal de que recalque outrora ocorreu. É sinal de há pulsão reivindicando satisfação.
O homem civilizado é o homem do medo. Temente ao Pai recalcado, Vorstellung da Lei, que em um momento lógico disse: Não!
Fugimos à nossa pulsão em favor dos outros, mas ao mesmo tempo evitamos os outros por conta da pulsão. Somos por estrutura, divididos. Sentimos medo (Angst) por isso. Tentamos nos livrar disso por meios mais diversos: adoecemos, somatizamos, atuamos, drogamos, bebemos, para nada desta divisão querermos saber.

A grande diferença entre tristeza e depressão

Estou de volta parceiros de leitura. Trago um tema debatido muitas vezes, mas que ainda traz um problema, e que quero compartilhar com vocês.
O uso do termo “depressão” já virou moda. Em qualquer conversa ou lugar que envolva observações e comentários sobre o estado emocional de alguém, a palavra “depressão” é dita sem critério. Mas afinal, onde foi parar a velha e famosa tristeza? Será que não sentimos mais tristeza? Ela não existe mais?
Ultimamente, no lugar da palavra “triste” estão usando “deprimido”, Esqueceram, ou nunca ficou claro que entre tristeza e depressão há uma grande diferença.
Outro dia vi na TV uma personagem que havia acabado de brigar com o amor de sua vida e se sentou sozinha em um restaurante. Ao ser questionada sobre seu desânimo e sua cabeça baixa naquele momento, ela respondeu: “Estou deprimida”. Essa foi demais hein! Parece até cena de comédia.
Depressão é um estado de adoecimento. Um transtorno psíquico que atinge o funcionamento do corpo todo. A pessoa perde interesse pela própria vida e pela vida de quem a rodeia. Não investe mais em seus objetivos e constrói um isolamento intenso. Tem dificuldade para falar o por quê de estar assim. Chora sem motivos claros e não consegue achar as causas disso. Nesses casos há uma perda da vontade de sair dessa situação. A pessoa se anula e fica tomada pelo sentimento de invalidez e incapacidade. O vazio e a angústia invadem seu psiquismo. É algo que vem e não diz de onde veio.
Agora, aqui cabem as perguntas: isso, da forma como dita acima é o que muita gente sente por aí quando afirmam estarem deprimidas? Isso é o que a personagem da TV estava passando naquela cena?
Vamos à tristeza então.
Ficamos tristes por perdas, decepções, desacordos, faltas do dia-a-dia. E é extremamente normal que alguém fique triste por essas coisas, por horas, dias e até meses. Pode ocorrer de uma pessoa ficar triste por longo tempo e nem por isso entrar em um quadro de depressão.
Parece que nos esquecemos de sentir a tristeza com todo direito que temos. Não esqueçamos então de que as palavras “triste”, “tristonho” e “entristecido” existem.
Na ética da psicanálise há uma luta pela vida que está por trás dos rótulos e diagnósticos que as pessoas se dão e assumem. Não serão simples comportamentos que farão alguém ser deprimido. Seja na tristeza ou na depressão, se ouvida com calma e com o tempo que merece (em tratamento adequado) a pessoa pode criar condições de buscar saídas para essas coisas que surgem sem dizer como e nem de onde vieram... Coisas tipicamente humanas.

Sobre o riso e o choro


Qual é a primeira reação que temos ao nascer? Choramos... Reagimos ao desconforto e damos sinal de vida.
Mas por que nesse momento o bebê chora?
A princípio parece uma pergunta banal. Se pararmos para pensar por que é que o choro surge nessa hora ao invés de outra reação do corpo, aí fica difícil responder. Penso que o bebê chora porque não lhe é possível fazer mais nada diante da dor e do excesso de estímulos desconfortáveis sobre seu corpo. Luz, mudança térmica, seus membros saindo do repouso e uma corrente de ar invadindo e abrindo seu pulmão. Se ele falasse, alguma palavra pesada escutaríamos.
A intensidade das experiências pode ser percebida quando um choro forte aparece ou um sorriso natural. Mas por que diante da dor, seja ela física ou psíquica, nós choramos? E por que diante de algo prazeroso, nós sorrimos?
Sensações e percepções de diversas situações, nunca serão completamente assimiladas e sempre faltarão palavras para dar conta dessas experiências. Nessas situações que provocam sensações indizíveis por completo, sorrimos ou choramos. E posso dizer que a maioria delas será sempre inesgotável pelas palavras. Pois bem, podemos pensar então que o choro e o riso seriam descargas da sensação criada diante de um estímulo? Seria uma forma de dar vazão e escoamento à tensão acumulada?
É possível percebermos que cada pessoa tem seu limite e que suporta as coisas conforme um limite próprio e único. Quando esse limite é ultrapassado por excesso de sensações de dor, sofrimento, angústia, graça e prazer, uma tensão se acumula e há a descarga corporal. A saída de lágrimas, o grito, o movimento que envolve o choro são formas de escoar o sofrimento, bem como a gargalhada de escoar o prazer. Comparando, lembro aqui da água se transbordando e se escoando de um copo quando está acima do limite ou de uma piscina transbordando. Não é por acaso que algumas pessoas sentem alívio após o choro, desde que não seja um choro contido, pois o acumulo da tensão ainda permaneceria.
Aqui vale lembrar a frase popularmente repetida: “tem que rir pra não chorar”. Ora, haveria algo em comum entre o riso e o choro? Ambos atendem ao mesmo propósito da descarga?
Tanto o choro quanto o riso são reações corporais consequências de excesso de estímulo, seja escutando algo, vendo ou lembrando. Também choramos de felicidade e até mesmo quando o riso é intenso as lágrimas saem. Que loucura!
A cada um cabe, respeitando o seu jeito próprio, esvaziar a tensão, sempre que preciso for... Ou esse acúmulo retornará de formas mais violentas, solicitando ser esvaziado. Mas mesmo assim um resto não esgotável permanecerá. O que faremos então? É melhor rir pra não chorar! Quer dizer, rir ou chorar vai dar no mesmo, ou seja, descarregar.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

TED - siga esta ideia

Pessoal,
Vale a pena conhecermos esta nova proposta de contribuir para o mundo, no que tange ao meio ambiente, à parte social, aos fatores econômicos sustentáveis e à ciência.
TED é uma sigla (Tecnologia, Entreterimento e Design) que reune as mentes mais brilhantes do mundo propondo novos modos de conduzir a vida. Este movimento surgiu em 1984 na Califórnia, onde houve espaço para artistas, inventores e aventureiros exporem suas propostas inovadoras e ousadas.
Aqui no Brasil já tivemos uma conferência em São Paulo e recentemente houve um encontro na Amazônia.
Vale a pena conferir --> http://www.ted.com/

terça-feira, 26 de abril de 2011

O arco da vida, a flecha da morte

O que fazer do nascer e do morrer? Há como poupar o psiquismo do buraco que o nascimento deixou e do não saber que a morte causa?

O fato de sermos seres de linguagem nos coloca diferentes de qualquer outra coisa no mundo. É por conta da palavra, da capacidade de falar que nosso psiquismo tornou-se um aparelho avançado e organizado. A única forma de assimilarmos as experiências da vida é através do falar, das expressões, pensamentos e memórias. Tudo isso só é possível graças à linguagem.
Porém, a palavra tem seus limites, e os nossos registros no aparelho psíquico não totalizam as experiências em si, pois já são traduções em linguagem do real experienciado e não propriamente o fato. Há sempre uma perda de significados nessa passagem da experiência crua para o registro no inconsciente.
Dentre todos as experiências humanas, podemos identificar duas impossíveis de serem significadas. Na primeira a linguagem ainda não existe, e na outra ela já deixou de existir. Se não há linguagem não há estruturação psíquica capaz de memorizar, portanto, fatos que, no inconsciente não possuirão registro: o nascer e o morrer.
Quanto ao nascimento, só posteriormente será possível dar conta dessa marca, dessa experiência não registrada. Só depois, ao longo do crescimento, ao adquirir a linguagem, que tentaremos contornar esse problema. Um buraco que dia-a-dia tentamos significar, mas que para a vida toda carregaremos.
Já, da morte... O que falar?
A morte é a questão que atravessa a existência humana e que ninguém consegue dizer exatamente. Especula-se, fantasia-se, imagina-se... Mas ninguém a esgota.
O vazio, como vimos mais acima, esteve no passado, na origem. Como vimos agora, estará também no futuro. E é o que mais atormenta, no presente, a vida inconsciente do Homem.
Entre o vazio do nascer e do morrer, somos assim tão livres para criar algo diferente? Podemos contornar o buraco ao invés de nos afundarmos nele?
Alguns conseguem saídas dessa miserável tristeza neurótica e adiam a tendência de irem ao encontro da morte. Em outros, de forma sutil ou escancarada, esse destino trágico é colocado em cena com um certo acordo.
Mas o que será que faz a diferença?
Está para cada um a chance de, entre os dois pontos, traçar fatidicamente a menor distância (reta), ou produzir curvas e percursos diversos. Vive-se como a flecha e vai direto ao alvo ou se constrói sabiamente o arco da vida.
Mas o que será que faz a diferença?