terça-feira, 6 de agosto de 2013

Entrevista ao Jornal Observador para o Dia dos Pais

Pais protetores
Nenhum pai deseja perigo para seus filhos. Porém o risco de proteger excessivamente pode se transformar numa dificuldade para ambos os lados, ocasionando falta de compreensão e atrapalhando o desenvolvimento das crianças. O OBSERVADOR conversou com o psicanalista Thales Siqueira de Carvalho

A criança, junto com seu pai, coberta de roupas da cabeça aos pés, vai fazer uma pequena visita a seus avós. Durante o percurso, a viagem é paralisada de quinze em quinze minutos, para que o pai verifique se seu garotinho está limpo, como faz sempre. Chegando à casa dos avós, não permite que a criança engatinhe no chão. Brincar somente no tapete, também não.
Satisfeito, o pai acha que, cuidando desta maneira, está fazendo com que seu pimpolho fique longe de todas as ameaças. A verdade é que, quanto mais zelo tem, mais receio de que o perigo possa acontecer. Dessa forma, pai e filho vão se acostumando e, sem notar, os responsáveis passam a proteger demais seus filhos deixando-os isolados. E se seguirem com isso, futuramente, o seu filho terá de conviver com crianças, mas sem nenhuma preparação para encarar o mundo.
Entre obrigação natural de dar proteção às crianças e os exageros da proteção, vários pais têm dificuldades em colocar seus próprios limites. Aos poucos, o que era comum, como não deixar que a criança fique brincando na areia do parque onde muitos gatos e cachorros passam, se torna uma ação radical de nem levar o filho ao chão.
Assim, até chegar à adolescência e mesmo quando adulto, os pais colocam uma difícil relação com seus filhos, que ocasiona incompreensão dos dois lados e atrapalha a autoconfiança dos pequenos. “Meus pais sempre retiraram as dificuldades que poderiam surgir para mim e me facilitavam as coisas. O interessante é que faziam isto para fazer cobrança depois. Eu compreendo a intenção deles, que é boa, mas isso atualmente me traz sequelas horrorosas. Não consigo lutar sozinho pelas coisas e correr atrás das minhas metas. Fui muito mimado”. Relata um jovem profissional liberal.
Este é um comportamento dos pais que dão muita proteção aos filhos. O objetivo, como disse o jovem, é ajudar só que, terminam criando uma relação de dependência e dificuldade para se desenvolver. O psicanalista Thales Siqueira de Carvalho, é Especialista em Teoria Psicanalítica e Mestre em Investigações Clínicas Psicanalíticas. Há 8 anos atende em seu consultório em Pedro Leopoldo-MG e Belo Horizonte-MG. Ele comenta a realidade de superproteção que se referiu o jovem:  “Na verdade, a superproteção de um pai ou de uma mãe revela a insegurança dos pais e não do filho. Quando um comportamento ou estilo de vida é perpetuado pelas gerações, os filhos tendem a repetir os pais no futuro. No caso, provavelmente, esse jeito do pai para com o filho têm suas raízes na maneira como este pai foi criado em sua infância. Não é por acaso que se comporta assim com o filho e os motivos disso podem ser tratados em análise, para que um destino menos angustiante seja dado a esse conflito”.
Muitos pais abdicam totalmente da proteção. Esta seria uma boa conduta para deixar que a criança caminhe com suas próprias pernas?  Thales responde: “proteção demais ou a ausência total dela dá na mesma, ou seja, em ambas as situações o filho crescerá de forma insegura e sem conseguir lidar sozinho com os desafios da vida. É fundamental que o filho sinta que pode contar com os pais, mas um poder contar quando precisar e não o tempo todo e de forma esmagadora. Exercer a função paterna é muitas vezes fazer uma presença pontual e não sufocante. É preciso saber que há um tempo para o filho deixar aberturas para que os pais entrem, pois também vai querer se virar sozinho em determinados momentos”.
O que se observa é que em diversos momentos, é mais fácil interferir para solucionar um problema do que deixar que o filho o avalie e mostre suas condições de resolvê-lo. Como esta atitude pode interferir na formação da personalidade da criança? “a personalidade se forma ao longo dos primeiros anos de vida, e uma criança crescer em um meio em que os pais resolvam tudo por ela acaba gerando um funcionamento psíquico de dependência extrema, de modo que a criança, no futuro vá repetir ocasiões em que isso novamente venha à tona, ou seja, provavelmente vai buscar se colocar em situações em que precise sempre de alguém para resolver as coisas por ela, seja no trabalho, escola e relacionamentos amorosos. Nós passamos a vida repetindo inconscientemente uma tentativa de revivermos aquelas relações afetivas infantis para com os pais, mesmo que desprazerosas e causadoras de angústia”.
É fundamental para os pais descobrir que a forma de levar a vida é baseada no equilíbrio entre colocar as mãos e regressar, para deixar que as crianças conduzam realmente as suas vidas. Sem isto, não terá valor a importância de decidir, de reconhecer suas possibilidades e também seus limites. Ajudar os filhos a crescer: esta é uma prova de amor realmente. Thales ainda complementa: “É preciso alguém para realizar a função paterna, não o tempo todo, mas de forma consistente no tempo que for preciso. Ser pai e mãe é inclusive saber se fazer faltar para o filho. Pois é a partir da falta que um filho se movimenta e cresce, mas isso não pode ser uma falta completa, pois aí teríamos a devastação”.