Trago aqui um resumo de minha
palestra, realizada na quarta-feira dia 02/12/15, em mais um evento no Hotel Tupyguá.
Ocasião organizada por Maria Florêncio, que sabiamente trouxe convidados
especiais implicados em pensar a condição humana e dispostos a uma reflexão
crítica a respeito da tão falada “crise”, seja ela a crise social, seja ela a
crise pessoal que cada um enfrenta em sua particularidade. Pude contar com uma
participação ativa dos convidados em perguntas e pontuações perspicazes, dignas
de pessoas atentas ao real. Segue abaixo o tema trabalhado no evento. Vou me
restringir a escrever brevemente o que levantei como provocação a partir da
Psicanálise.
Qual
é o estatuto das crises? A rigor, para a Psicanálise, toda crise é econômica!
Seja ela do Estado ou de um indivíduo, o que coloca uma existência em crise é
um problema econômico. E aqui não digo que economia, para a Psicanálise, se
restrinja ao dinheiro, ao lado financeiro da coisa. O termo ‘econômico’ nos
remete ao fator quantitativo e o quanto uma pessoa investe seu afeto, sua
energia, sua pulsão de vida nas coisas que realmente vão lhe render frutos. E o
quanto investir errado um afeto deixa um indivíduo em crise. No Estado, nos
Governos, nas políticas ou na vida particular, o que traz uma crise é um desuso
da matemática, é um descaso com o fator econômico, ou seja, é a negligência e boicote
ao investir afeto, energia e pulsão onde você já sabia que não ia dar certo.
Mas como saber que ali eu não terei um retorno interessante e irei me arruinar?
Como evitar o problema econômico que me leva à crise? Pois bem, o que nos aponta
uma crise e o que nos tira dela é o real! Basta ler o real! Assimilar o que
real nos apresenta, pois as crises são sempre anunciadas. E quem nos anuncia é
o real. Como dizia o psicanalista francês Jacques Lacan: “existe saber no
real”. Há saber no real, e somente aqueles que conseguem ler este saber no real
é que se posicionam de maneira interessante frente uma possível crise.
Um Estado ou uma
pessoa só entra em crise, quando nega o saber no real. O real não falha, os
fatos, os dados, os números, mostram, os resultados nos dizem algo, porém nós
ignoramos, passamos adiante sem nada querer deste saber, e é exatamente assim que
topamos com uma crise. Por rejeitarmos tanto o real, acabamos tendo que lidar
com rompimentos de barragens, com o retorno daquilo que evitamos tratar e que
apenas fomos guardando em um espaço onde não cabia mais tanto rejeito. O
desastre da barragem na cidade de Mariana é uma metáfora do nosso funcionamento
psíquico. O que aconteceu lá é similar ao que acontece dentro do psiquismo de
cada pessoa. Rejeitamos aquilo que não queremos saber, evitamos ter que lidar
com aquilo que o real nos mostra, e assim, nossas barragens vão se rompendo ao
longo da vida. As dores crônicas, as enxaquecas, os cânceres, as gastrites, as
somatizações diversas, não passam de sintomas sinais de que sua barragem está a
ponto de estourar.
Freud nos
afirmou certa vez que: “sofremos de reminiscências”. Ou seja, sofremos de
lembranças. A memória nos faz sofrer. Do conteúdo memorizado, deste material
guardado, o que não for tratado, retornará de forma avassaladora. O que você
rejeita em si mesmo retorna por outras vias. Não que devamos querer saber de
todo o lixo que rejeitamos; não que o ser-humano tenha que suportar todas as
suas lembranças e resgatar da barragem o material tóxico intratável e assim
suportá-lo a qualquer custo. Mas rejeitar tudo, sem um mínimo de esforço de
tratamento é o que pode sobrecarregar a barragem e colocar o aparelho psíquico
em colapso.
Em cada
indivíduo, a barragem pessoal dá sinais de que algo não vai bem, pois o saber
no real aponta e mostra. Insistir na negação desse saber no real é favorecer o
desastre. É se colocar em risco.
Colar no real,
saber ler o saber no real, fazer um bom uso da matemática na sua pulsão, não
abusar das contas de seu afeto, não investir mal sua energia, aí sim podemos
nos prevenir e sair de uma crise, na esfera particular ou na esfera pública.
A questão é
prevenir-se de si mesmo, pois há um masoquismo estrutural que insiste em nos
levar para a crise. O Ser humano precisa, no real, defender-se de sua própria
pulsão de morte. E isso não tem como negar... Ou melhor, até tem, pois muitos
vivem negando o real e pagam um alto preço por isso. Façamos as contas e
decidamos em que estamos dispostos a pagar. Você é o parâmetro de si mesmo,
portanto, sua própria solução. Basta ler o saber que existe no seu real.
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